Recentemente, eu li o livro Sobre a Escrita – A Arte em Memórias, de Stephen King, e fiquei maravilhado com a obra.

Neste livro, King fala um pouco sobre a sua vida, a sua experiência como escritor e dá dicas de narrativa e linguagem para jovens escritores.

O livro é voltado para escritores de ficção, mas muitas das dicas de King também são aplicáveis à confecção de roteiros.

E foi pensando nisso que preparei essa lista com nove dicas de escrita de Stephen King.

Ao longo deste post, eu vou apresentar dicas sobre:

  • Métodos e rotinas de escrita
  • Maneiras de melhorar a sua escrita
  • A importância de feedback e revisão
  • A construção de personagens e de diálogos
  • A definição do tema do seu filme

Tenho certeza que algumas dessas dicas (talvez todas!) irão ajudá-lo a escrever melhor.

Vamos então à nossa lista com nove dicas de escrita de Stephen King aplicáveis à escrita de roteiro.

Escreva com a porta fechada

Esta talvez seja a maior regra de Stephen King.

É uma sugestão que lhe foi dada pelo seu primeiro editor, quando ele escrevia a coluna esportiva de um pequeno jornal.

A “porta fechada” aqui é tanto literal quanto metafórica.

Enquanto escreve, King se isola do mundo. Ele fecha as portas e janelas. E escuta música.

Ele só sai do escritório após ter atingido o seu objetivo diário. Esse é um dos significados da “porta fechada”

Mas a “porta fechada” tem outro significado: é uma referência ao fato de que você não se deve mostrar uma escrita em andamento à ninguém.

A primeira versão do seu texto é só sua.

Mostrar um texto incipiente à outra pessoa e receber um feedback negativo pode desencorajá-lo a continuar escrevendo.

Daí a importância de “escrever com a porta fechada”. E isso se relaciona bem com a segunda regra:

Reescreva com a porta aberta

Uma vez que você finalizou a sua primeira versão do texto e – mais importante – corrigiu todos os erros e incongruências que encontrou, é hora de abrir a porta.

Isso significa receber feedback.

King conta que ele tem um grupo pequeno de umas oito pessoas (sendo a mais importante a sua esposa, Tabitha) que leem os seus textos regularmente, e lhe oferecem críticas construtivas.

Você, como roteirista, também precisa fazer isso. Precisa abrir o seu roteiro para que outras pessoas possam lê-lo

Só assim você vai saber se as ideias que estavam na sua cabeça se transpuseram para a página.

Ou, o que é mais comum, se algo foi perdido durante essa transição.

Para um roteirista, é muito fácil ficar perdido na história e pensar que todo mundo vai compreendê-la da mesma maneira que você. Mas nem sempre é assim.

Ter opiniões externas é essencial.

Porém, deve-se saber diferenciar as pessoas que querem ajudá-lo daquelas que visam prejudicá-lo – e existem muitas destas.

Críticas construtivas são bem-vindas, inveja não.

Use o seu próprio vocabulário

Essa é uma lição para a vida toda.

Escritores iniciantes muitas vezes são desencorajados por acharem que não são bons o suficiente.

Esse pensamento se forma quando lemos textos que julgamos ser muito melhores do que os nossos.

Na visão de quem está começando, textos rebuscados, com palavras difíceis, parecem soar melhor do que textos diretos.

Pensando assim, e visando melhorar, o escritor novato tenta copiar uma linguagem que não é a sua.

O resultado é algo genérico e, em muitos casos, ruim.

Usar o seu próprio vocabulários significa escrever dentro das suas limitações.

Isso não significa que você não deve aspirar por algo a mais, mas deve fazê-lo nos seus próprios termos.

É comum que tentemos emular a escrita de um autor que admiramos.

Você pode tentar escrever copiando o estilo de H.P. Lovecraft. Mas, se você fizer isso, o leitor pode se questionar se vale a pena ler a cópia, e não o original.

Usar a sua própria linguagem e o seu próprio vocabulário é um passo importante para desenvolver a sua própria voz como escritor.

Para isso, porém, também é importante que você:

Leia muito e escreva muito

King fala que isso parece óbvio, mas muitos escritores não conseguem seguir essa regra básica.

A leitura é uma ferramenta essencial no trabalho do escritor.

King vai mais longe dizendo que se você não tem tempo para ler, também não vai ter tempo (e nem conhecimento) para escrever.

A leitura é essencial para que possamos aprender como estruturar uma sentença, para que saibamos como escrever um bom diálogo, para compreendermos como fazer uma boa descrição, etc.

King se refere especificamente à escritores de ficção e à leitura de livros, mas o mesmo se aplica a roteiristas. É importante conhecer a sua área.

Portanto, leia muitos roteiros.

Você consegue encontrar vários roteiros na internet. E, se não sabe por onde começar, eu sugiro o meu post com 10 roteiros vencedores do Oscar.

Capa do livro Sobre a escrita, com dicas de escrita de Stephen King

Faça uma descrição simples e consistente

Quando menciona uma boa descrição de cena, King explica que ela consiste em poucos detalhes bem escolhidos que falem sobre todo o resto.

Ou seja, uma descrição deve ser simples, porém eficiente. E isso também é aplicável aos roteiros.

Não precisamos perder tempo descrevendo extensivamente os detalhes de um cenário ou da roupa de um personagem, caso isso não seja importante.

Se o quarto é vazio e sem vida, diga isso. Se é atulhado de móveis, explique isso também.

Mas não se desgaste descrevendo cada um dos objetos de cena.

Lembre-se que o cinema é uma mídia audiovisual. A imagem vai mostrar muito mais do que as palavras do roteiro.

Portanto, descreva apenas aquilo que é relevante para a narrativa.

Saiba que ações dizem mais do que diálogos

Um dos problemas mais comuns dos roteiros, principalmente nos primeiros tratamentos, é a escrita de diálogos extensos e expositivos.

Isso torna a leitura maçante e atrasa as ações do seu roteiro.

Show, don’t tell. Mostre, não conte. Para King, esta é a regra mais básica da escrita. Também é a primeira regra a ser esquecida pelos escritores.

Portanto, lembre-se disso: as ações dos personagens são mais importantes do que as suas falas.

As ações dos personagens que revelam quem eles realmente são.

Afinal, uma pessoa pode mentir sobre as suas intenções durante um diálogo. Mas a ação dela fala por si só.

É claro que roteiristas como Aaron Sorkin constroem as suas narrativas em cima de diálogos. Nesse caso, essa regra não se aplica.

Mas Sorkin faz parte da exceção, não da regra.

De uma maneira geral, é melhor investir menos em longos diálogos e mais em ação. E quando for escrever seus diálogos, siga a próxima dica.

Escreva diálogos honestos

Honestidade é a chave para a escrita de bons diálogos.

King diz que você precisa escrever a fala da maneira como o personagem a pronuncia.

Isso pode até incluir diálogos com palavrões e com ofensas, caso necessário.

Essa é uma linha tênue, pois se liga com a censura e com a classificação indicativa. É difícil, portanto, seguir essa dica à risca.

Mas o que podemos tirar disso é que a fala do personagem nem sempre reflete a opinião do escritor/roteirista.

Se um personagem é preconceituoso, a fala dele vai transparecer isso.

Isso não significa que o escritor que é preconceituoso por ter colocado as palavras na boca do personagem.

O escritor só foi honesto com a voz daquele personagem, por mais que discorde do que ele fala.

Desenvolva seus personagens coadjuvantes

King tem uma definição muito boa para justificar o desenvolvimento dos personagens coadjuvantes. Segundo ele, ninguém é o “melhor amigo” na vida real.

Cada pessoa é o protagonista da sua vida.

E ao tratar cada personagem como o protagonista da sua própria história, você vai conseguir desenvolvê-los propriamente, tornando-se seres multidimensionais.

Quando um personagem é mal desenvolvido, o público tem a sensação de que aquela pessoa só existe dentro do tempo de duração do filme. Não havia nada antes e não haverá nada depois.

Ao contrário disso, no bom desenvolvimento ficamos com a impressão de que o personagem já existia, e a câmera só captou um fragmento de uma história muito maior, maior até do que o próprio filme.

Um dos melhores exemplos de desenvolvimento de personagens coadjuvantes que eu já vi foi no filme Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, escrito por Charlie Kaufman.

Nesse filme, o roteirista conseguiu dar densidade a todos os seus personagens coadjuvantes.

Cada pessoa ali tem uma história e um drama bem definido.

Nem todo mundo consegue escrever como Charlie Kaufman e isso não é um problema. Mas você pode utilizá-lo como um guia para o seu próprio roteiro.

E se quiser ler o roteiro original de Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, clique aqui.

Escreva a história antes do tema

O tema dita tudo o que vai acontecer na história. É algo essencial para a narrativa.

Não por acaso, definir o tema de uma história, seja na literatura ou no cinema, é uma das tarefas mais difíceis para o escritor/roteirista.

Mas, para King, o tema não é tão importante, ao menos não num primeiro momento.

Segundo ele, o escritor não precisa pensar no tema quando estiver fazendo o seu primeiro tratamento.

King afirma que ao escrever livremente, sem essa preocupação, o escritor permitirá que o tema se manifeste naturalmente durante a escrita.

É claro que se você já souber qual é o seu tema desde o início, isso vai guiar a sua escrita e provavelmente facilitar o seu trabalho.

Mas a maior dica aqui é que, se você não sabe qual é o tema, não se preocupe. Apenas escreva e veja o que acontece.

Caso a sua escrita livre faça o tema florescer, você deve trazer o tema para o centro da sua narrativa durante a escrita da sua segunda versão.

Ou seja, você deve reestruturar as informações e as ações de acordo com o tema da história.

Volto aqui ao exemplo do Aaron Sorkin.

Enquanto trabalhava no filme Steve Jobs, o roteirista deu uma entrevista falando sobre a estrutura da sua história em três arcos distintos.

Na época, ele declarou que estava com dificuldade em encontrar uma conexão entre esses arcos.

Ou seja, ele estava com dificuldade em definir o tema, algo que atravessasse toda a história e ligasse os pontos.

Eventualmente, ele encontrou o tema do filme: a paternidade problemática do protagonista.

A relação problemática de Jobs com a filha é central à obra. É o tema do filme. Mas quando estava escrevendo o roteiro, Sorkin ainda não sabia disso.

Ele só continuou escrevendo. Isso nos leva à:

Conclusão:

Cada escritor tem o seu método e a sua maneira de escrever. Não existem regras pré-definidas.

O objetivo de listas como esta é tentar auxiliar quem está com dificuldade.

Portanto, você não precisa seguir à risca todas as dicas de King para se tornar um escritor talentoso.

Porém, é possível que você tenha encontrado algo aqui que tenha chamado a sua atenção. Se isso aconteceu, vá fundo e aplique a dica à sua escrita.

Caso esteja com dificuldade em escolher uma dica para seguir, a minha sugestão é que você comece com a quarta.

Ou seja, leia muito e escreva muito. E, quem sabe, aos poucos tente incorporar outras das dicas de King à escrita.

Por hoje é isso. Espero que eu ajudado vocês com essas dicas do mestre do terror.

Caso tenha gostado deste post, leia também os posts que eu fiz sobre como escrever uma cena de terror, como escrever uma cena de sonho e como escrever uma conversa telefônica.

E não se esqueça de assinar a nossa newsletter (ali na barra lateral).

Até a próxima. E boa escrita a todos!